![]() |
Contando um pouco da minha história e dos desafios que enfrentei - e enfrento até hoje |
No último sábado de abril ministrei a palestra "Lesado Medular - Um desafio a cada dia", que preparei para o II Simpósio Mineiro de Reabilitação em Lesão Medular, no Hotel Royal, aqui em Belo Horizonte. O simpósio foi organizado pelas fisioterapeutas Joyce e Simone, da AquafisioBH, onde faço hidroterapia, e foi voltado para fisioterapeutas e profissionais envolvidos com reabilitação de pessoas que sofreram lesão medular. A ideia da Joyce ao me chamar foi mostrar um pouco dos desafios que uma pessoa com lesão enfrenta, do ponto de vista do próprio paciente.
![]() |
Antes da lesão, muito esporte, muita festa, muita diversão |
Comecei mostrando como era minha vida nos últimos meses antes da lesão, contextualizando minha situação para que entendessem como reagi após o acontecido e como enfrentei - e enfrento até hoje - os desafios do dia a dia. Falei que estava em um momento muito ativo, morava em Floripa, estava só estudando, fazendo mestrado na UFSC, tinha terminado um relacionamento há pouco tempo e fazia esportes todo dia, ia de bike pra universidade e fim de semana fazia trilha no sábado e trekking no domingo - e ainda tinha balada todo fim de semana e praia sempre que dava na telha. Meu fim de semana começava na quinta feira meio dia, que era quando acabava a última aula da semana, e acabava na terça às oito da manhã, quando começava a primeira aula. Enfim, eu estava com a vida que pedi a Deus.
![]() |
Nas férias, curtindo com os amigos |
Chegaram as férias do mestrado e vim para Minas ver os amigos e parentes. Encontrei a família, amigos e ex rolos e namoradas, curti muito. E uma semana antes de voltar as aulas, aconteceu o acidente. Contei como aconteceu, como fui socorrido e o doloroso processo de hospital em hospital, com a reação da família e tudo mais. E, principalmente, como foi minha reação. Sei que sou um caso muito raro, senão único, pois eu tinha tudo para me desesperar, ficar triste e até deprimido, já que minha vida era muito ativa e livre. Mas usei de minha racionalidade e conhecimento para reagir. Pensei: "já está feito o estrago, não posso fazer nada para reverter isto, então preciso comemorar que estou vivo e retomar minha vida o mais rápido possível". E assim fiz. Afinal de contas, a alternativa era muito pior. Eu poderia estar morto.
![]() |
Após o acidente, no hospital, ainda de bom humor |
Vieram os primeiros desafios, após a artrodese que colocou minha coluna no lugar: entender o funcionamento do corpo, os primeiros movimentos, e as coisas básicas, necessidades fisiológicas, banho, sono. E aí uma coisa que assusta muita gente: a cadeira de rodas. Ao contrário de muita gente que não aceita virar cadeirante, ficar "preso" à cadeira de rodas, eu estava doido para ir para a cadeira logo. Afinal, eu já estava de cama há uns quinze dias, por causa da cirurgia. Rodava para todo lado, mas ainda não podia sair. Mais alguns dias e convenci uma enfermeira a me levar para fora do hospital, mesmo sem poder. Foi incrível ver o céu novamente. Aí que fiquei ainda mais ansioso para sair rodando de cadeira de rodas.
![]() |
Entre os primeiros desafios, as transferências, no início com a tábua do Sarah, depois sem ela |
Saindo do hospital, novos desafios. Primeiro, adaptar a casa para mim. Depois, fazer fisioterapia. Já tinha começado no hospital, consegui fazer em casa graças ao programa de Home Care do meu plano de saúde. Com fisioterapia consegui melhorar o controle do corpo, ganhar força e melhorar as transferências. Aí consegui a internação no Sarah, que me trouxe muita informação sobre a vida na cadeira de rodas. Depois disso, dirigir foi o que quis fazer primeiro. Sabia que o carro iria me dar muita autonomia e liberdade. Tirei carteira adaptada, comprei carro adaptado, e aí ninguém mais me segurava. Ia sozinho para a fisioterapia em clínica, voltei ao mestrado e ia sozinho para as aulas, e para onde mais tivesse vontade. Nesse meio tempo, outros desafios surgiram e fui superando, como sair à noite, namorar, praticar esportes, viajar.
![]() |
Dirigir foi uma das primeiras coisas que quis voltar a fazer |
E claro, para tornar tudo possível, precisei também voltar a trabalhar. Aqui um adendo: muita gente consegue aposentar por invalidez, mesmo em condições de trabalhar, e se acomoda. Acreditem, se a pessoa tem condições, vale muito à pena voltar. E o melhor caminho é concurso público, não há dúvida. Tentei um processo seletivo, fui muito bem nele, mas não fui chamado. Descobri depois que a empresa tinha escadas na entrada. Parece que não quiseram ter o trabalho de adaptar... Percebendo isto, achei que valia a pena tentar concurso. E consegui de primeira. Isso mudou minha vida, e só cheguei onde estou, consegui muita coisa, por ter voltado a trabalhar.
![]() |
Após vencer os primeiros desafios, quis me desafiar cada vez mais |
E então resolvi criar novos desafios, já que consegui superar todos até aquele momento. Corri atrás de tudo que curtia fazer antes da lesão, e mais. Muito mais. Quem acompanha o blog sabe disso. Foi depois da lesão que fiz a primeira grande viagem ao exterior - já tinha ido a outros países vizinhos, mas outros continentes só fui como cadeirante. Pratiquei esportes que sempre quis depois da lesão, conheci muita gente bacana e continuei saindo, viajando e encontrando com amigos sempre que quis - ou melhor, faço isso sempre que quero. Muita gente diz que sou mais ativo que muita gente que anda, e é verdade. Isso tudo apesar do maior desafio que ainda enfrento até hoje após a lesão - a dor. Sofro de dor crônica, muito forte, constante, vinte e quatro horas por dia. E ainda assim faço de tudo.
Ah, claro, contei meu segredo para superar tudo bem e o que me dá força para sempre seguir em frente. Para fechar a palestra, preparei um vídeo que mostra um pouco de tudo que falei. Ficou muito legal, compartilhei nas redes sociais e bombou. Confiram acima! A recepção do público foi ótima, uma das pessoas falou que foi a melhor palestra, fiquei muito satisfeito.
Conheço esse cara (virtualmente) a uns 4 anos, é um exemplo pra ser seguido
ResponderExcluirObrigado Artur, grande abraço!
Excluir